Na minha profissão não há
“trabalhadores”, chamamo-nos uns aos outros “colaboradores”. (assim ao jeito de
“colaboracionistas”).
Na minha profissão também não há
“patrões”, todos somos “colegas” e inscritos numa mesma instituição com o
propósito de defender (os nossos) interesses.
Na minha profissão, o “patrão” é,
quando muito, apenas um “coordenador”.
Na minha profissão a instituição
que tem o propósito de defender (os nossos) interesses, defende antes os seus
(deles) interesses, dos tais que, sendo nossos “colegas” e “coordenadores” do
nosso trabalho, não se chamam afinal a si mesmos de “patrões”. Nem nós a eles
chamamos. Na minha profissão, ninguém “se chama”.
Assim, na minha profissão também
não há “sindicato”, apenas uma “ordem”, em que os “colaboradores” são quem
menos ordena. Todos seremos iguais, mas há sempre alguém mais igual que tu.
Na minha profissão, a “ordem” cobra
aos associados para trabalharem. Apesar de os respectivos cursos estarem
reconhecidos, em qualquer situação só se “podem exercer os actos próprios da
profissão” com as quotas em dia…Ou seja, pagando obrigatoriamente para se poder
trabalhar. Esse pagamento é feito a quem “seria suposto” defender-nos…
Na minha profissão…
Na minha profissão ninguém é
“empregado”, as pessoas “têm trabalho” ou “não têm trabalho”.
Na minha profissão também ninguém
tem “contratos de trabalho”. A vida é um imenso livrinho de recibos verdes que
se vão passando de mão em mão.
Na minha profissão também ninguém
é ” despedido” afinal. Só se é ”despedido” no caso raro de algum dia se ter
sido “admitido”. O adeus não é chorado nem indemnizado, apenas um simpático
“não tenho mais trabalho para ti” ou um singelo “ como sabes, isto está mal, a
crise e tudo isso…”
Na minha profissão…
Na minha profissão é tolerado ( e
protegido ) o trabalho gratuito através da “figura” ( triste) que se chama
estágio não - pago. Os estágios são uma “ espécie protegida ”, são considerados
uma primeira oportunidade para quem sai das Universidades após cerca de 6 anos
de estudo.
Na minha profissão, a
“instituição para a qual pagamos para poder trabalhar”, anuncia no seu site de
“emprego”, múltiplos anúncios quer de trabalho em geral “ a recibo”, quer de
estágio. Empresas e gabinetes cada vez anunciam mais requererem estágios em que
apenas pagam metade, já que o restante é pago pelo estado através do IEFP. Diriam sempre que “não têm trabalho” se fosse
para “trabalhar a sério” ou “empregar-se”, mas para um estagiário mal pago ou
não pago de todo, há “sempre lugar para mais um”…que afinal não era nada, que”
há muito que fazer” se forem essas as condições…
Na minha profissão ninguém é
afinal “explorado”, estamos em crise, “ e mais vale assim do que não se
trabalhar” (…e porquê?)
…Porque, na minha profissão, como
ninguém é “empregado”, ninguém é também “desempregado” e portanto, na minha
profissão ( em geral ) também ninguém
tem direito a “subsídio de desemprego”…porque na minha profissão não temos
“contratos”, apenas “passamos recibos …(“..acho que já tinha dito esta”)…
E portanto ( continuando),
ninguém se revolta ou contesta, com receio de poder ser ainda pior…e o pior é
que é mesmo (pior)…E isso todos já percebemos esse “pior do pior”.
Na minha profissão ninguém se
revolta, as pessoas emigram.
Peço desculpa. (É mentira!) …Na
minha profissão ninguém “emigra”. Emigrar é coisa de pobres. Na minha
profissão, as pessoas “estão a trabalhar lá fora”, ou a “ empreender novas
experiências noutros países”.
Na minha profissão…
Na minha profissão quem faz o
grosso do trabalho, ganha sempre menos. (“
mas não é assim em todas as profissões? “De que se queixam, piegas? )
Na minha profissão, quem faz a
menor parte do trabalho, assina em geral o Projecto de Arquitectura como
“autor”. (“ mas não é assim em todas as
profissões? “De que se queixam, piegas? )
A minha profissão tem coisas
fantásticas: Glamour, muita criatividade, vários prémios Pritzker entregues aos
melhores profissionais.
A minha profissão, dizem…”está em
crise”.“Com a crise”, quem antes
“apenas” explorava a tempo inteiro os seus colaboradores através do recibo verde, explora agora apenas de vez em
quando… os mesmos ex-colaboradores ( entretanto despedidos por causa da crise…)…porque
( e ainda bem ) que apesar da enorme baixa de
encomendas ( infelizmente real ) ainda há uns trabalhitos para acabar lá pelo
gabinete…
Assim, a crise não é ainda ou
sequer o triste fim da exploração, mas ainda mais exploração sobre
exploração… só que agora os ex-colaboradores despedidos ( quase) têm pena do “Arquitecto – coitado – que agora
– com – a – crise – isto – está - mau – e – já – nem – ele – tem - trabalho – sequer
– para – ele - apenas – sobras”…
Vou – lhe chamar agora
“profissão” entre aspas.
Com tantos edifícios para
reabilitar em Portugal, há ainda e cada vez mais Arquitectos convencidos “que a
nossa única possibilidade é a emigração”, porque cá “não há trabalho”… Falta de
cultura nossa, cívica e política, é o que é…
São milhares de edifícios para
serem reabilitados em Projectos de arquitectura e Engenharia em potência, um
imenso “mercado” a criar, dando trabalho a Engenheiros, Arquitectos, Operários
da construção Civil…
E a vida será um amanhã que
canta, “e o sol brilhará pra todos nós”! Na minha profissão…
Pedro Figueiredo - Arquitecto.