05 novembro 2007

Direitos e deveres: Jornal de Notícias

São os trabalhadores independentes, ou recibos verdes, quem tem a maior lista de obrigações e a mais pequena de direitos. A diferença de regalias e protecção pela lei do trabalho face aos contratados é tão grande que há quem diga que são vistos como trabalhadores de segunda categoria. Nem todos os 900 mil trabalhadores nestas circunstâncias são "falsos" recibos verdes; uma parte trabalhará mesmo como independente. Mas verdadeiros ou falsos, todos são tratados de igual forma.

Começando pela Segurança Social, um "recibo verde" tem que fazer descontos todos os meses, a partir do segundo ano de actividade - mesmo que não tenha tido rendimentos no mês em questão. O valor a pagar corresponde a 11% de múltiplos do Indexante de Apoio Social (o IAS, que este ano é igual ao salário mínimo, mas começará a ter um valor próprio a partir de 2008). Ou seja, agora, o desconto mínimo é de 11% de 1,5 IAS, ou 66 euros.

Quanto mais alto for o desconto, maior será a pensão de reforma, mas até lá (e para a maioria destes trabalhadores esse é um futuro ainda muito distante), não ganham nada em fazer mais descontos. É que este dinheiro não lhe compra mais apoios sociais.

Cristina Andrade, do Ferve - movimento contra os recibos verdes -, enunciou ao JN a lista dos não-direitos dos "recibo verde" "não temos direito a subsídio de desemprego e, mesmo que não trabalhemos durante algum tempo, somos obrigados a continuar a fazer descontos. Também não temos subsídio de doença", a não ser que escolham um regime de protecção alargado, que implica o pagamento de prestações mais altas.

Fora do alcance destas pessoas, continuou, estão também regalias a cargo dos empregadores, porque parte-se do princípio que trabalham por conta própria e não para uma empresa - um raciocínio que cai por terra mediante os trabalhadores classificados como independentes mas que, na verdade, deviam integrar os quadros da empresa. É o caso do subsídio de Natal e de Férias. E a pessoa só tem direito a dias de descanso se a entidade pagadora assim o entender.

Diferença também no fisco

Quanto ao fisco, há, logo à partida, uma grande diferença independentemente do rendimento realmente obtido, a pessoa pagará sempre imposto sobre um valor mínimo definido pelo fisco, de 2821 euros (este ano). Fora este "pormenor", há três regimes à escolha: simplificado, de contabilidade organizada ou acto isolado, aplicado quando a pessoa é contratada para desempenhar tarefas esporádicas. Neste caso, são retidos na fonte 10% do valor do recibo, se for superior a 9.959,17 euros. Também terá que cobrar 21% de IVA à entidade pagadora e entregá-lo ao Estado.

O regime de contabilidade organizada justifica-se sobretudo quando o trabalhador gasta mais do que 30% dos rendimentos com deslocações, compra de materiais e outras despesas indispensáveis, já que estes valores são dedutíveis à matéria colectável. Entre as desvantagens estão a obrigação de contratar um técnico oficial de contas e de registar todos os movimentos de entrada e saída de dinheiro.

Para os restantes trabalhadores, justifica-se o regime simplificado. Aqui, o fisco só cobra impostos sobre 70% dos rendimentos (a taxa de IRS a pagar depende desse valor). Os restantes 30% são considerados automaticamente despesas dedutíveis. Só terá que cobrar e entregar IVA se os rendimentos ultrapassarem os dez mil euros.

Bolseiros também sem SS

Uma das principais reivindicações dos bolseiros de investigação científica é serem tratados como trabalhadores e terem, assim, acesso ao regime geral da Segurança Social. Joana Marques, da associação dos bolseiros, contou ao JN que só podem fazer descontos para o regime voluntário da Segurança Social. "Temos acesso a subsídio de maternidade e de doença, mas não de desemprego", disse. Quanto à pensão de reforma, "também fazemos descontos, mas por norma pelo salário mínimo".

MUITOS DEVERES E POUCOS DIREITOS

Iniciar actividade no Fisco

Terá que levar o Cartão de Contribuinte e o Bilhete de Identidade ou Passaporte e escolher a profissão. Depois é que poderá comprar o livro de recibos, que até são azuis.



Um ano de borla na SS

Após o início da actividade, pode ficar um ano sem fazer descontos para a Segurança Social, mas começa a pagar a partir do segundo ano, mesmo que nesse mês não tenha tido rendimentos. A inscrição é obrigatória até ao dia 15 do 13º mês de actividade. Fica isento de inscrição quem receber menos de 2400 euros/ano. Para se inscrever tem que levar a declaração de início de actividade.



Cuidado ao cancelar

Se ficar sem rendimentos durante algum tempo (perdeu o trabalho ou esteve doente, por exemplo), pense bem antes de cancelar a actividade no fisco. É que depois ficará impedido de reiniciar a actividade durante um ano inteiro.



É mesmo independente?

Obedecer a ordens de chefia, ter horário e local de trabalho, utilizar os meios da empresa no desempenho da profissão. Estes são critérios que o podem classificar como "falso" recibo verde. As empresas não costumam aceitar de bom grado a passagem aos quadros, mas os tribunais são sempre um recurso possível.

2 comentários:

marta disse...

Boa tarde! Parabéns por este Vosso blog!
Sim, este regime de recibos verdes, nomeadamente com as novas alterações impostas pelo governo é, no mínimo, ultrajante! Posso afirmar que sou impedida de trabalhar!
Eu sou formadora e trabalho como docente numa escola. Para exercer a actividade de formadora estou colectada como trabalhadora independente, logo utilizo os recibos verdes. Na escola, estou a contracto.
Até ao momento, pela escola, ganhava mais do que o ordenado mínimo nacional, o que evitava que pagasse segurança social, por via dos recibos verdes. No entanto, e no próximo ano lectivo, o meu horário laboral vai diminuir, devido a uma alteração da estrutura curricular do curso em que sou docente. Deste modo, não vou conseguir atingir o ordenado mínimo nacional. Obrigatoriamente, terei que pagar, todos os meses, cerca de 152€ à Segurança Social!
Como sabemos, a actividade de formação não é constante e o pagamento dos nossos honorários nem sempre é realizado atempadamente.
Pois bem, não reúno as condições necessárias para poder pagar 152€, sem receber qualquer vencimento! Até 2006, encerrava a actividade, mas agora já não posso fazê-lo, porque sou obrigada a manter a actividade em aberto! Caso contrário, não poderei voltar a reabri-la, pelo menos, durante 1 ano!
Falam em «Isenção» ou «Redução» de pagamentos! Devo afirmar que isto é altamente enganador! Vou dar um exemplo prático: caso eu requeira esta redução ou isenção em Janeiro de 2009, a Segurança Social vai reger-se sobre os meus rendimentos auferidos no ano transacto, enquanto profissional independente. Esta situação é altamente inadequada! No ano transacto posso ter auferido um rendimento razoável, mas tal não significa que o mesmo aconteça em 2009! Posso não conseguir qualquer trabalho como formadora, durante meses! E, ao longo deste período, tenho que pagar determinado valor à Segurança Social, segundo um raciocínio de cálculo que se reporta a uma realidade que não é a actual!
Porque não se calcula o pagamento a realizar, pelos profissionais independentes, nomeadamente por quem desempenha este tipo de actividades, com estas condições, tal como se processa com o IRS?! A proposta é que se calcule a possibilidade de «Isenção» ou de «Redução», com base no ano actual e não no ano transacto, sem obrigar o trabalhador independente a pagar antecipadamente à Segurança Social, na esperança de, posteriormente, receber o valor já entregue, no caso de cobrança indevida! Sabemos que esta solução é impensável, segundo a lógica do nosso Governo! Mas também é impensável, na conjuntura actual, que o cidadão seja obrigado a pagar uma exorbitância à Segurança Social (mínimo 152€), quer usufrua ou não de rendimentos e sem possuir os mesmos direitos que um trabalhador por conta de outrem!
Marta Azevedo Silva
koskakot@gmail.com

BlueBus disse...

Olá!
E se nos juntássemos todos para contractar um bom advogado e procesar-mos o estado português, tendo em conta que eles nos cobram um "serviço" que não nos prestam... não temos direito a baixa, etc... todos juntos conseguimos um excelente advogado....